Égloga Basto de Francisco de Sá de Miranda (7)
GIL
34
Tu sabes que eu me abrigara
a esta vida de pastor;
viera corrido à vara,
cuidei que era esta melhor,
que ouvira e não a provara.
Determinava-me já
d’andar com minhas ovelhas;
a conta saiu-me má;
mas «também cá, como lá
fadas há,» dizem-no as velhas.
35
Andei d’aquém para além;
vira terras e lugares,
tudo seus avessos tem;
o que não espermentares
não cuides que o sabes bem;
e às vezes, quando cuidamos
que esprimentado o já temos,
à cabra cega jogamos;
achei-vos cá; fortes amos
querem que os adoremos.
36
Pêra o mal que te acontece
buscas o amo: ora o sono,
ora al que nunca falece;
ao trosquiar achas dono,
as pressas não te conhece.
Tudo lhes o demo deu,
té razões más que nos dão;
quando te hão mester, és seu,
quando os hás mester, és teu:
que não tens amos então.
37
Essa vez que saem à rua
estremece toda a aldeã;
eles bebem homem sua,
dói-lhes pouco a dor alhea,
querem que nos doa a sua.
Inda que é o dano em grosso,
fora de dissimular
no mais, mas nisto não posso:
o entendimento que é nosso,
não no-lo querem deixar.
38
Pólo qual c’o meu fardel
fugi das vossas aldeãs;
não trago nos beiços mel
nunca fui cresta-colmeas,
nem posso ser ministrel.
A saudade não se estrece,
mas caiu-me um coração
em sorte, que muito empece:
outro senhor não conhece,
somente a boa razão.
39
Porém queixo-me-te logo,
que, em casos que aconteceram,
vi-me por ela no fogo;
bradei e não me valeram
brados, queixumes, nem rogo.
Então me saí meu quedo
a quedo; e fará algum dia
o que outro não fez; e hei medo
de ver mor vingança cedo
do que já agora queria.
Foto - bucolismo moderno - bela adolescente fazendo xixi no
campo.
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